domingo, 17 de janeiro de 2010

Será que o Google é maior do que a China?


por Pedro Doria

Após longos anos de uma relação tortuosa, o Google decidiu entrar em confronto com o governo chinês. Cogita, inclusive, deixar o país.

Oficialmente, a administração da empresa se irritou quando seu serviço de e-mail, o Gmail, sofreu um ataque de hackers que buscavam ler as mensagens de ativistas que incomodam Beijing. Que o ataque partiu do governo chinês foi confirmado na quinta-feira, pela consultoria de segurança iDefense.

Extraoficialmente, quer dizer outra coisa. Um dos jovens fundadores do Google, Sergey Brin (ao lado de Larry Page), ganhou sua velha briga com o principal executivo da empresa, Eric Schmidt.

Brin nasceu na Rússia ainda soviética. Tem horror a ditaduras. Schmidt foi contratado quando ainda havia dúvidas sobre o futuro do Google. Os investidores tinham medo de que, na mão dos jovens criadores, a empresa naufragasse. Contrataram um executivo. Os três se dão bem, mas vez por outra há conflitos entre os valores dos fundadores e o pragmatismo de negócios do executivo. A China era um desses casos.

No site Google.cn estava uma versão modificada do sistema de buscas, obediente à censura chinesa, sem Dalai Lama ou menção ao massacre da Praça Tiananmen.

O Google explicava que, quando decide entrar num país, obedecia suas leis, não importa quais. Na China, bem ou mal, prestava um serviço. Melhor um Google cheio de informações, ainda que incompleto, do que Google nenhum.

Agora, os céticos argumentam que o Google não estava tão bem assim na China. O maior site de buscas, lá, é disparado o chinês Baidu. O negócio era pequeno, abandoná-lo não dói no bolso.

Só que não é verdade. Segundo a empresa StatCounter, o Google vinha crescendo sensivelmente. Baidu, que contava com 71% do mercado em agosto passado, já encostava nos 55%, em dezembro. No mesmo período, o Google cresceu de 27% para 43%. Estão, surpreendentemente, abandonando o negócio em um de seus melhores momentos.

Até o momento em que fez seu radical anúncio a respeito da China, o Google vinha apanhando da imprensa. Coisa rara: em geral, a maioria dos comentaristas têm a empresa em boa conta. Mas o lançamento de seu celular, o Nexus One, semana passada, foi um desastre. Além de o aparelho ser instável, o atendimento ao consumidor anda terrível.

Embora seja conveniente, ninguém ameaça abandonar a economia que mais cresce no mundo apenas para se livrar de um problema passageiro de relações públicas.

A China é uma ditadura sofisticada. O chinês que souber driblar os mecanismos de censura eletrônica o faz. O governo tem consciência disso, está vigilante, mas não interfere. O importante é que o grosso da população chinesa da rede não se depare com o que não deve. Se alguns encontram material proibido, o governo finge que não vê. Só persegue mesmo quem deseja fazer algo a respeito da informação. Os ativistas são os únicos perseguidos.

O Google não é o primeiro a enfrentar a China. A Automattic, responsável pelo software WordPress, se recusa a censurar seu site de blogs gratuitos WordPress.com. Assim, deixa de ter o tráfego das centenas de milhões de chineses.

Mas são poucas as exceções. Ao declarar que não vai tolerar tentativas do governo chinês de conseguir informação que possa comprometer gente de oposição ao governo, o Google deixa mal quem continua por lá. O exemplo mais notável é o Yahoo, que inadvertidamente já foi responsável pela prisão de pelo menos um blogueiro. Mas também a Microsoft parece fraca.

A questão que fica: será que o Google tem tanto poder quanto um país? Consegue dobrar a China? A ver.

Fonte: www.estadao.com.br

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